Beira-mar

Conversa à beira-mar. A grandiosidade de Jorge Amado, o Nobel de Literatura é como o Oscar, uma bobagem, ninguém recorda quem ganhou o Oscar no ano passado e retrasado e assim por diante, bem como o Nobel, ninguém recorda, um ou outro marcante fica na memória, marcante pela justiça, Saramago, ou pelo despropósito, aquele cantorzinho fanho, Jorge Amado não ganhou Nobel porque há preconceito contra o escritor que vende muito, mesmo que seja excelente escritor, caso de Amado. Vê só quem ganha Nobel hoje em dia, ninguém nunca ouviu falar, deve ter vendido uns dez livrinhos em seu país. Amado não ganhou, também, porque somos periféricos e o Nobel pertence ao hemisfério lá de cima, especialmente europeus e estadunidenses. Amado vendia, vende muito, e as histórias são ricas, os coronéis do interior nas suas lutas sangrentas de poder, a perda gradativa desse mesmo poder, misturado com a sensualidade e a comida, e não só isso, claro. Olha como aquele cachorro gosta da água do mar, e aquela criança correndo para as ondas e os pais confiantes lá em cima no guarda-sol, que perigo, vamos desviar desses dois jogando na praia, é proibido jogar na praia, mas o povo ignora proibições. Os filmes, o problema da maior parte dos filmes feitos hoje é a falta de um bom roteiro, tem tanto livro bom que podia virar filme, mas os roteiros são os mesmos, são esquemáticos, as mesma histórias, a gente adivinha o que vai acontecer, ou são roteiros sem pé nem cabeça, mil tiros, perseguição de veículos, a pé, brigas, e os diálogos, corra, vá, fuja, por aqui. Ainda bem que a gente pode escolher filmes nos cardápios, imagina quem só tem a tevê aberta, a tevê aberta vai morrer, vai não, vai ficar cada vez pior, exclusivamente para os mais pobres e para as salas de espera, os hotéis mais pobrezinhos do interior dispõem de pelo menos um canal de notícias e um canal de filmes, tevê aberta é o lixo, lembra quando a gente ligava e ficava procurando o que ver e não havia nada. Que biquíni minúsculo, corajosa. Não estou vendo os guarda-vidas, só as bandeiras de perigo, colocaram as bandeiras e foram para casa ou vagabundar. Há preconceito contra Paulo Coelho, veja só, o povo aceita ler Harry Potter, Stephen King, mas mete o cacete em Paulo Coelho. O Nobel, não que Paulo merecesse ganhar, mas o Nobel só vai para desconhecido, cadê que Philip Roth ganhou, cadê Ian McEwan, se o cara vender livros não presta para os empoados nórdicos. Jorge Amado adorava um Bataclan, e quando ele fez Tieta mudar o nome do Nid d’Amour para Refúgios dos Lordes, e era lá no tal Refúgio que as grandes negociatas dos políticos aconteciam, como deve ser até hoje, esses escroques fazem seus negócios sujos nos bordéis. E quando aquele Coronel Jesuíno matou a mulher e o dentista e não queria ir a julgamento, e foi, e foi condenado, Amado mostrou que, mesmo devagar, as coisas mudam. É, mas hoje parece que o mundo está girando ao contrário, a ciência e os fatos desacreditados, a gente está indo para o Medievo, é, vamos entrar no mar, a água está delícia, vem.