Mrs. Dalloway, Virginia Woolf, 1925

Mrs. Dalloway, Virginia Woolf, 1925, 228 páginas, tradução de Claudio Alves Marcondes, Penguin Companhia. Início: 25/12/2020 – Fim: 06/01/2021. Nota 2 (escala de 1 a 5). 

Aviso de spoiler: vou escrever sobre todo o enredo do livro, continue por sua conta e risco. 

É um livro famoso, mas não é um livro inesquecível ou relevante. Deixa-se ler. Principais defeitos: arrastado, monótono, personagens antipáticos, tudo é frívolo, tudo são aparências. Qualidades principais: a contundente história paralela de Septimus Warren Smith, o suicídio de Septimus, a loucura, as reflexões sobre a morte. 

A história se arrasta em um único dia de junho, uma quarta-feira. Clarissa Dalloway, cinquenta e poucos anos, recém saída de alguma doença, vai dar mais uma de suas festas. Clarissa sai de casa, compra flores, volta para casa, conserta um vestido que havia se descosturado. De noite, recebe os convidados, a festa evolui e termina. 

Este é o eixo que estrutura o livro. Em torno desse eixo, orbitam trechos de outras vidas, outros personagens. 

Peter Walsh, amigo da juventude, foi apaixonado por Clarissa, mas ela preferiu o apático Richard Dalloway. Peter é um fracassado, viajou, aventurou-se, casou, separou, morou na Índia, lá mantém um caso com Daisy, uma mulher casada. Peter voltou para Londres batendo lata, vai tentar descolar algum empreguinho. Visita Clarissa no dia da festa, de manhã, e participa da festa à noite. Continua fascinado pela insignificante Clarissa. Dava até para gostar do personagem, sarcástico, vê que todos ali vivem de aparências, mas é um fraco, também, e não conseguiu se livrar dessa paixonite inútil da juventude. 

Clarissa Dalloway é isso: insignificante, sem cultura e sem conhecimentos, sua única habilidade e único divertimento é dar essas festas imotivadas. Superficial, arrogante, insegura. 

Richard Dalloway, desinteressante. Elizabeth Dalloway, a filha, saindo da adolescência, parece querer desafiar o domínio da mãe, mas não parece que conseguirá, fraca, insegura, mimada. 

Sally Seton, enfim uma personagem da qual se pode gostar. Por pouco tempo. Amiga da juventude de Clarissa e Peter. Clarissa foi atraída sexualmente por Sally, até apaixonada. Sally era esfuziante, desafiadora, moderna. Todavia, depois da juventude, casa com um lorde qualquer e bota cinco filhos no mundo. 

O grande personagem do livro é Septimus Warren Smith, que não mantém nenhuma relação direta com Clarissa. Septimus e a esposa, Lucrezia, estão no parque e Peter passa por eles. Na festa, o médico de Septimus comenta sobre ele com Richard e Clarissa. Ou seja, a história de Septimus é completamente apartada daquela de Clarissa, seus convidados frívolos e sua festa frívola. 

Lucrezia é uma coitadinha, relativamente ingênua, uma italiana que teve o infortúnio de casar com Septimus em um arroubo de entusiasmo. 

Septimus participou da Grande Guerra, presenciou tragédias e a morte de um amigo. Desalentado e sem sentir nada, ainda na Itália, casa-se com a jovem Lucrezia e voltam para a Inglaterra. Septimus retoma seu emprego, tem uma boa carreira pela frente. Todavia, Septimus está completamente enlouquecido. Tudo o que não sentiu na guerra e no pós-guerra se transformou em vozes, visões, epifanias. Ouve revelações, escreve mensagens sobre o fim dos tempos, ouve e sente a natureza, vê e ouve o amigo morto. A loucura de Septimus é bela, é grandiosa. Septimus anuncia que vai se matar, faz planos para se matar juntamente com Lucrezia. Ela faz com que consulte os médicos, que não resolvem nada da situação dele. No dia da festa de Clarissa, uma consulta com um médico renomado que recomenda a internação; depois, de tarde, a calma, uma conversa até normal entre o casal. Chega o médico e Septimus pula pela janela, espatifa-se em cima de uma gradil. 

Repito, toda as partes que se referem a Septimus conformam o melhor do livro. Não sei se, naquela época, Virginia Woolf já havia passado por episódios de loucura. De todo modo, há bastante verossimilhança na loucura de Septimus, no desejo de morte dele, e na incapacidade dos médicos. 

Aquela “sociedade” inglesa retratada no romance é detestável. Gente insatisfeita e superficial. A vida de Clarissa é uma farsa: ela teme a morte e a loucura, é frígida e sentia atração por mulheres, mas afasta de si qualquer pensamento perigoso. 

Um livro regular, abaixo da média; penso que se pode passar pelo mundo da literatura sem conhecê-lo.


Resumo (não há capítulos ou divisões no livro). 

Clarissa Dalloway sai para comprar flores, vai dar uma festa à noite. Recorda-se de Peter Walsh, amigo com quem não se casou. Septimus e a esposa passam pela mesma rua da floricultura. Clarissa volta para casa. Começa a consertar o vestido e pensa em sua frigidez e seu gosto por mulheres. Peter faz uma visita breve, chora e foge. Peter caminha pela cidade e vai ao parque, recorda a juventude, Sally, Clarissa e Richard. Septimus delira no parque; conta-se a história dele, a morte do amigo, o casamento, a loucura, o tratamento inútil com o médico Holmes. Septimus e Lucrezia são atendidos pelo médico Bradshaw. Hugh e Richard almoçam com Lady Bruton que queria ajuda para escrever uma carta para um jornal sobre a emigração de jovens para o Canadá. Richard compra flores, leva-as para Clarissa em casa, e sai novamente. Miss Kilman, uma mulher religiosa, amarga e pobre, que se tornou amiga e mentora de Elizabeth. As duas saem para fazer compras e tomar chá. Elizabeth ansiosa para se ver livre de Kilman, despede-se e caminha pela cidade. Pensa em se tornar fazendeira ou médica. Septimus, em casa, entre a realidade e o delírio. Chega o médico Bradshaw, Septimus se joga da janela. Peter no hotel, se arruma, desce para jantar, caminha para a festa de Clarissa. A festa: somente futilidades. Peter, Sally Seton, o primeiro-ministro. O médico conta a Richard sobre o suicídio de um paciente. A mulher do médico conta a Clarissa sobre o suicídio. Fim de festa feira, gente frustrada, aparências, a fascinação do Peter Tolinho pela Clarissa Vazia. Fim. 


Trechos: 

“Precisava ter um filho como Septimus, dizia. Mas ninguém podia ser como Septimus; tão gentil; tão sério; tão inteligente. Não podia ela ler Shakespeare também? Era um autor muito difícil?, perguntou. 

Não dá para ter filhos em um mundo assim. Não dá para perpetuar o sofrimento, ou multiplicar a raça dessas criaturas lascivas, que não têm emoções duradouras, mas apenas caprichos e vaidades, que as arrastam ora para um lado, ora para outro.” 

“Oh, meu Deus!, ocorreu a Clarissa, bem no meio da minha festa, eis que chega a morte, pensou.” 

“Que direito tinham os Bradshaw de falar da morte em sua festa? Um rapaz havia se matado. E comentavam isso em sua festa – os Bradshaw falavam da morte.” 

“A morte era um desafio. A morte era uma tentativa de comunicar; [...] Havia um abraço na morte.” 

“Depois (só nessa manhã ela se dera conta) havia o terror; essa incapacidade assoberbante, colocada em nossas mãos pelos pais, essa existência, para ser vivida até o fim, para ser acompanhada serenamente; no fundo de seu coração jazia um pavor medonho. Mesmo agora, quantas vezes não teria perecido, se Richard não estivesse ali lendo o Times, permitindo a ela se encolher como um pássaro e pouco a pouco recobrar o calor, fazer com que essa alegria imensa se inflamasse, raspando um toco de madeira no outro, uma coisa na outra. Ela conseguira escapar. Mas aquele rapaz se matara.”