Antônio e Cleópatra, William Shakespeare, 1607, 174 páginas, tradução de Beatriz Viégas-Faria, L&PM. Início: 09/03/2021 – Fim: 12/03/2021. Nota 3 (Bom).
A história de Otávio, Antônio e Cleópatra, na visão romantizada de Shakespeare.
A peça retrata a época em que o império romano era governado pelo triunvirato composto por Antônio, Otávio e Lépido.
Antônio dominava a parte oriental do império romano e vivia com Cleópatra no Egito. A mulher de Antônio, Fúlvia, iniciou uma guerra contra Otávio, em Roma, querendo atrair Antônio de volta. Fúlvia perdeu a guerra e morreu doente pouco depois. Antônio volta a Roma para negociar com Otávio (o futuro Augusto César). Como sinal de reconciliação entre ambos, Antônio aceita se casar com a irmã de Otávio, Otávia. O casamento dura oito anos. Mas Otávio e Antônio se desentendem novamente, e Antônio vai de vez para os braços de Cleópatra, abandonando Otávia.
Otávio inicia uma campanha militar contra Antônio. Na Grécia, durante a batalha naval de Áccio, Cleópatra foge do confronto com a frota egípcia e Antônio, enlouquecido, vai atrás dela em seu navio, abandonando sua frota e seu exército no fragor da batalha.
Otávio se dirige ao Egito para combater o casal de amantes. Durante as batalhas, Antônio se mata. Cleópatra iria ser levada em triunfo por Otávio, mas ela se mata antes.
A peça reconta fatos históricos, embora ainda hoje restem dúvidas sobre alguns pontos. De todo modo, um defeito da peça é fazer parecer que tudo aquilo aconteceu em sequência, de forma rápida e encadeada. Não foi assim; por exemplo, Antônio ficou casado com Otávia durante oito anos, e Otávio só foi ao Egito um ano depois da batalha de Áccio.
Para mim, o que mais se destaca na peça é a ambiguidade de Cleópatra e a instabilidade emocional e a flutuação de emoções de Antônio. Em dado momento, Cleópatra é um rouxinol para Antônio; no momento seguinte, é uma rameira. A Cleópatra da peça é ambígua quando a tragédia se aproxima: parece gostar de Antônio e, ao mesmo tempo, parece tentar se salvar da catástrofe.
Como sempre acontece em Shakespeare, a peça tem diversos momentos cômicos e sarcásticos, principalmente ligados ao personagem Enobarbus, auxiliar de Antônio. Apesar das falas irônicas, Enobarbus tem um final trágico: ele deserta das tropas de Antônio, passa-se para o lado de Otávio, mas se arrepende e se mata.
Antônio revela-se um personagem fraco, um indivíduo que não consegue se desvencilhar da paixão excessiva por Cleópatra. O ponto mais baixo de sua trajetória é abandonar seus comandados durante a batalha de Áccio para seguir a egípcia.
Um dos trechos mais curiosos da peça acontece quando o Bardo fala da própria peça. Ao descobrir que será levada prisioneira para ser exibida em triunfo por Otávio em Roma, Cleópatra diz a uma de suas servas:
“Cleópatra: Agora, Iras, o que pensas disso? Tu, uma boneca egípcia a ser exibida em Roma tanto quanto eu. Escravos, trabalhadores quaisquer, de aventais gordurosos, réguas e martelos irão nos erguer no ar para que todos nos vejam. No mau hálito deles, vamos sentir o cheiro de comida barata; seremos obrigadas a respirar naquela nuvem quente do bafo dos plebeus que nos cercam.
Iras: Que os deuses não permitam uma coisa dessas!
Cleópatra: Não, Iras, isso é certo. Litores lascivos e insolentes vão pensar que somos rameiras, e maus poetas vão escrever baladas ruins sobre nós. Os bons comediantes, de improviso, põem nossa história no palco e apresentam “Orgias de Alexandria”. Antônio será representado bêbado, e eu vou assistir à Cleópatra esganiçada de um rapazote, toda a minha majestade em pose de puta.”
Resumo.
Ato
1
Cena
1. Egito. Antônio ignora mensagens de Roma, fascinado por Cleópatra. Ela
demonstra raiva por ele e pela esposa dele.
Cena
2. Egito. Brincadeiras entre os servos. Antônio recebe a mensagem de que Sexto
Pompeu ameaça o triunvirato e de que Fúlvia morreu, e decide voltar à Roma.
Cena
3. Egito. Antônio comunica a Cleópatra a necessidade da viagem.
Cena
4. Roma. Otávio e Lépidus preocupam-se com Pompeu e com a ausência de Antônio,
enfeitiçado pela cigana. “Antônio não pode de modo algum desculpar-se por seus
estigmas quando somos nós que suportamos todo o peso de sua leveza.”
Cena
5. Egito. Cleópatra recebe notícias de Antônio.
Ato
2
Cena
1. Sicília. Pompeu e Menas discutem sobre o confronto com Roma. “Ignorantes de
quem somos, muitas vezes nós imploramos pelo que nos será danoso, coisa que as
forças sábias nos negam para nosso próprio bem; então descobre-se que saímos
lucrando ao não serem atendidas as nossas preces.”
Cena
2. Roma. Antônio e Otávio esclarecem os conflitos entre eles. Lépidus é mero
acompanhante. Acerta-se o casamento de Antônio com Otávia, irmã de Otávio.
Sobre Cleópatra: “Sabe-se que as coisas mais vis tornam-se atraentes nela, e os
santos sacerdotes abençoam-na quando ela se mostra uma devassa.”
Cena
3. Roma. Um adivinho alerta Antônio sobre o perigo de ficar junto a Otávio
César.
Cena
4. Roma. Lépidus se despede de generais que vão para o combate.
Cena
5. Egito. Cleópatra é informada acerca do casamento de Antônio.
Cena
6. Sicília. Acordo entre o triunvirato e Pompeu: este fica com a Sicília e a
Sardenha e pagará um tributo a Roma.
Cena
7. Sicília. Comemoração no barco de Pompeu. Todos bêbados, cantam e dançam.
Ato
3
Cena
1. Ventídio derrota os partos.
Cena
2. Roma. Despedida de Antônio e Otávia que partem para Atenas.
Cena
3. Egito. Mensageiro descreve Otávia para Cleópatra, caprichando nos defeitos.
Cena
4. Atenas. Otávia vai para Roma intermediar as brigas entre Otávio e Antônio.
Cena
5. Atenas. Notícias de que Otávio derrotou Pompeu e aprisionou Lépidus.
Cena
6. Roma. Otávio recebe a irmã e diz que ela foi rejeitada por Antônio, que se
reuniu à rameira do Egito e prepara-se para combater contra Roma.
Cena
7. Áccio. Antônio e Cleópatra combatem Otávio no mar. Antônio foi aconselhado a
lutar em terra.
Cena
8 e 9. Áccio. Ordens para os combates.
Cena
10. Áccio. Cleópatra foge com seus navios e Antônio a segue. “Nunca antes se
violou assim a experiência, a virilidade, a honra!”
Cena
11. Egito. Antônio apresenta variações de comportamento. Perdeu o rumo e a
honra, mas pede amor, vinho e comida.
Cena
12. Otávio manda dizer a Cleópatra que a privilegiará desde que expulse ou mate
Antônio.
Cena
13. Antônio diz a Otávio que quer um combate singular. Um mensageiro de Otávio
explica a proposta dele para Cleópatra; ela parece aceitar. Antônio vê parte da
cena e manda açoitar o mensageiro. Antônio elogia Otávia, “joia rara de mulher”
e arrepende-se de estar com a rameira. Muda de humor e quer festejar com
Cleópatra.
Ato
4
Cena
1. Otávio prepara o exército para a batalha.
Cena
2. Antônio e suas flutuações de humor. Festa e vinho.
Cena
3. Alguns soldados desertam de Antônio.
Cena
4. Antônio veste-se para a batalha.
Cena
5. Enobarbo desertou e Antônio envia para ele as arcas e tesouro que deixou.
Cena
6. Otávio ordena que os desertores sejam colocados na frente do exército.
Enobarbo recebe seu tesouro e envergonha-se.
Cena
7. As tropas de Antônio se saem melhor na batalha.
Cena
8. Antônio volta para a cidade e comemora com Cleópatra, seu “rouxinol”.
Cena
9. Enobarbo se mata.
Cena
10. A batalha agora se desenrola em terra e no mar.
Cena
11. Otávio orienta o exército.
Cena
12. Antônio mostra valentia e depois desanima. Vê a esquadra se entregar a
Otávio, por causa da “egípcia imunda”, “puta, três vezes puta”. Diz que “a
bruxa tem que morrer, ela me vendeu ao jovem romano”.
Cena
13. Cleópatra se tranca no mausoléu e manda dizer a Antônio que se matou.
Cena
14. Antônio tenta se matar, mas fica agonizando. Recebe o aviso de que
Cleópatra está viva e é levado até ela.
Cena
15. Antônio morre e Cleópatra pensa em se matar.
Ato
5
Cena
1. Otávio é avisado da morte de Antônio, que lamenta, e manda avisar a
Cleópatra que o destino dela será decidido com honra e cortesia.
Cena
2. O enviado de Otávio evita que Cleópatra se mate. Otávio visita Cleópatra.
Ela entrega a Otávio uma lista de seus tesouros, mas descobre-se que ela
escondeu a outra metade. Ela descobre que será levada como uma presa do triunfo
de Otávio. Cleópatra diz que sua história será encenada no palco, com toda a
sua majestade em “pose de puta”. Um camponês traz um cesto com serpentes para a
rainha. Cleópatra se mata, suas ajudantes também. Antônio prepara o funeral dos
dois.