O fim da eternidade, Isaac Asimov, 1955, 256 páginas, tradução de Susana Alexandria, Aleph. Início: 11/03/2021 – Fim: 22/03/2021. Nota 3 (Bom).
Uma boa ficção científica sobre viagens no tempo e como pequenas mudanças no passado podem alterar a realidade presente e futura.
Aviso de spoiler: vou escrever sobre todo o enredo do livro, continue por sua conta e risco.
Asimov faz o leitor entrar já no meio dos acontecimentos, sem saber onde está, em que época, quem são aquelas pessoas. Aos poucos, o leitor vai conhecendo melhor o que fazem aqueles personagens e o que é a Eternidade. As pessoas que trabalham na Eternidade são chamados “os Eternos”, mas eles são seres humanos comuns que envelhecem e morrem. A Eternidade é como uma empresa ou fundação que organiza a vida humana ao longo dos séculos. A Eternidade é como um tubo, de elevador ou de metrô, que conduz o Eterno, por meio de uma cápsula, até qualquer ponto no Tempo, acima e abaixo, ao infinito. Os Eternos vivem nessa estrutura física, com quartos, salas de reunião, escritórios, bibliotecas.
Os Eternos podem ver e acessar qualquer parte do Tempo e, inclusive, fazer pequenas modificações em determinada situação que vai resultar em grandes alterações no futuro. Não há futuro ou passado para os Eternos: eles denominam tempo-acima e tempo-abaixo.
A teoria para conseguir esse meio de locomoção através do Tempo foi descoberta no século 24, por um tal de Mallansohn, mas somente no século 27 começaram as viagens no Tempo e a instituição Eternidade. A imensa energia necessária para alimentar essa “estrutura” é obtida por meio do Sol de milhões de anos no futuro, quando a nossa estrela se tornou uma Nova.
A Eternidade cuida das trocas comerciais entre os séculos e cuida para que a humanidade tenha uma vida melhor, modificando algo em determinado tempo e lugar que vai resultar em um futuro melhor.
O personagem principal, Andrew Harlan, é um Técnico, aquela pessoa dentro da Eternidade encarregada de fazer a menor modificação possível para obter o melhor resultado possível. Harlan nasceu no século 95, trabalha na estrutura da Eternidade e não pode voltar ao seu século ou ter uma vida normal.
Harlan “mora” no século 575 (ou seja, na “estação do metrô” da Eternidade com porta para aquele século). Ao fazer um trabalho no século 482, ele conhece Noÿs Lambent e se apaixona pela primeira vez, Daí em diante, a Eternidade começa a degringolar.
Um bom livro que não dá vontade de largar. Algumas situações são previsíveis. A pior parte é o machismo de Asimov, que não deve ser creditado somente a ele, mas à época em que ele viveu.
Sempre me espanta que esses caras da FC imaginem tanta situação futurística, viagens espaciais, colonizações, viagens no tempo, mas só consigam imaginar mulheres dependentes e objetos sexuais. Mesmo nesse contexto, Noÿs Lambent consegue ser um pouco menos submissa que outras personagens de FC.
Resumo.
Capítulo 1. Técnico.
Andrew Harlan embarca no século 575 para o século 2456. Ele nasceu no século 95. Ele está executando um plano do qual não sabemos nada. Ele é Técnico na Eternidade, tem 32 anos. Recebido pelo Sociólogo Kantor Voy. O Sociólogo calculou uma MMN, Mudança Mínima Necessária para alterar algum aspecto negativo do futuro que exigia a morte de doze pessoas. Harlan achou uma MMN em que bastava deslocar um recipiente de lugar com o mesmo resultado, a RMD, Resposta Máxima Desejada. Para não revelar o erro de Kantor Voy, Harlan pede um favor em troca: informação sobre um mapeamento de vida e uma mudança de realidade no século 482; isso é irregular. A MMN que Harlan vai fazer é para diminuir a quantidade de viciados; alterando a realidade para que isso aconteça, resulta também que não existirá um determinado tipo de naves espaciais no século 2481. Harlan pediu a Voy o mapeamento da vida de uma certa Noÿs Lambent. Harlan sabe que ele tem o poder de destruir a Eternidade.
Capítulo 2. Observador.
Harlan recorda sua formação. Foi escolhido aos 15 anos para ir à Eternidade. Os humanos comuns são chamados de Tempistas porque vivem no Tempo. Na Eternidade, há três classes de “funcionários”, os Aprendizes, os Observadores e os Especialistas. Entre os Especialistas há os Técnicos, os Computadores, os Sociólogos e outros. Depois de passar pela fase de Aprendiz, Harlan foi designado para ser Observador no século 482. Harlan é aficionado por História Primitiva, a história antes da entrada em funcionamento da Eternidade. Ele não gosta do século 482, que é hedonista e matriarcal. Seus relatórios chamam a atenção de um famoso Computador, Labam Twissell, que faz parte do Conselho Temporal. Twissell leva Harlan para ser seu Técnico particular.
Capítulo 3. Aprendiz.
Harlan “mora” na Eternidade, na “estação” do século 575. Ele recebe a missão de ensinar o Aprendiz Cooper tudo que for possível sobre História Primitiva. A primeira tarefa de Harlan como Técnico é fazer uma MMN, emperrar a embreagem (!) de um veículo no século 223; isso faz com que uma guerra no século 224 deixe de acontecer. Harlan se sente mal porque personalidades foram modificadas, pessoas morreram antes ou depois do que na realidade anterior, livros não foram escritos; mas a Eternidade guarda cópias desses livros que deixaram de existir. Mallansohn foi o inventor do Campo Temporal. Os Séculos Ocultos são aqueles entre 70 mil e 150 mil. Sem explicação, os Eternos não conseguem entrar nesses séculos. Depois do 150 mil, há diversas formas de vida, mas não há mais humanos.
Capítulo 4. Computador.
Há uma crise no século 482 e Harlan é chamado para observar. Ele conhece Noÿs Lambent, uma bela mulher Tempista que trabalha com o Computador Finge. A Eternidade é machista, só homens trabalham lá. Harlan vê a Eternidade como um mosteiro. Finge diz que há um propósito na presença de Noÿs. Ela deixa Harlan abalado. Ele nunca teve uma namorada e antipatiza com ela. Os Eternos podem requisitar uma mulher Tempista “para as finalidades óbvias”. Finge ordena que Harlan vá morar algum tempo na casa de Noÿs para melhor estudar o século 482.
Capítulo 5. Tempista.
O século 482 apresenta uma distribuição desigual da riqueza, mas os Eternos não querem corrigir isso. Harlan tenta evitar Noÿs mesmo morando na casa dela. Noÿs fica temerosa porque enquanto passou somente um mês na Eternidade, lá no Tempo se passaram três meses. Harlan também não sabe explicar. Harlan é obrigado a ir a uma festa com Noÿs. Depois, a sós com Noÿs, conversa, bebida, ela tem 27 anos. Uma mulher saindo Tempo traz dez vezes mais probabilidade de distorcer a Realidade. Sexo entre os dois. Harlan acha que descobriu um terrível segredo (?).
Capítulo 6. Mapeador de vida.
Um mês depois daquela noite, que é onde começa o primeiro capítulo, Harlan está no 2451. Ele entra no Tempo e muda um recipiente de lugar. No 2486, deixam de existir naves espaciais. Harlan: De que servem as viagens espaciais? Neron Feruque é o Mapeador. Tempistas não sabem sobre as Mudanças de Realidade. Na casa de Noÿs, um mês antes, Harlan com raiva de ter que fazer uma mudança de realidade no século 482 porque Noÿs mudaria, esqueceria dele, ou deixaria de existir. O Mapeador não vê Noÿs na futura Realidade do 482, mas também não a vê na anterior. Mistério.
Capítulo 7. Prelúdio do crime.
Harlan envia seu relato para Finge. Este reclama que Harlan não relatou tudo que aconteceu, faltam os “interlúdios” amorosos com Noÿs. Harlan avisa que quer se unir a Noÿs. Finge diz que após a Mudança de Realidade, Noÿs não vai querer saber de Harlan. Os Tempistas do 482 acreditam que os Eternos são realmente eternos, e que as mulheres que se unem aos Eternos se tornam, também, imortais. Por isso, Noÿs teve interesse em se unir a Harlan. Quando houver a Mudança de Realidade, os Tempistas não acreditarão mais nessa bobagem. Harlan e Noÿs foram cobaias naquele experimento. Harlan tenta agredir Finge. Decide cometer um crime para ficar com Noÿs.
Capítulo 8. Crime.
Harlan volta ao século 482 e tira Noÿs de lá. Ela percebeu que os Eternos não são eternos, mas fez sexo com ele porque talvez se tornasse imortal, e porque gostou dele e teve peninha. Harlan deixou Noÿs nas instalações do século oculto 111.394; não há Eternos lá, mas tem de tudo para viver. Harlan explicou sobre as Mudanças de Realidade e que elas são necessárias para o bem da humanidade, como por exemplo evitar guerras atômicas. Noÿs não vai mudar porque está fora da próxima mudança no 482. Ele vai descobrir como seria Noÿs no futuro 482 e ela voltaria para lá disfarçada.
Capítulo 9. Interlúdio.
Harlan volta ao seu 575. O Computador Twissell diz, misteriosamente, que Harlan acertou na mosca. Harlan sente que Noÿs está ligada aos Séculos Ocultos. Ele procurou uma Mudança que tivesse falha e que ele pudesse usar em uma chantagem. Questionamentos: se alguém é levado para a Eternidade e na Realidade original da pessoa ocorre uma Mudança, vai existir um análogo daquele que foi levado na nova Realidade? Harlan questiona se não estaria em um hospício sonhando com tudo aquilo. Com Noÿs no século oculto; ela diz que ele ficou bom em sexo; ele diz que o mérito é da professora. Harlan foi mais uma vez à casa de Noÿs no 482 e percebeu a presença de outra pessoa.
Capítulo 10. Encurralado!
Harlan errou os controles e foi à casa dela duas vezes no mesmo momento; então, ele viu a ele mesmo na casa. Harlan foi ao século 2451 (capítulo 1) para chantagear e conseguir a informação de que Noÿs não existe na nova Realidade do 482. Quando tenta ir para o século oculto onde ela está, a cápsula não passa do cem mil. Harlan vai até Finge e o ameaça. Finge diz que o Conselho Pan-Temporal sabe tudo sobre as atividades ilegais de Harlan, ele estava sendo vigiado. Finge não bloqueou o túnel.
Capítulo 11. Círculo completo.
Harlan volta o 575, procura Twissell e não o encontra. Noite difícil: “outros usos para uma mulher em cativeiro”. É acordado para comparecer a uma reunião do subcomitê do Conselho. Perguntas sobre os paradoxos das viagens no tempo. Sennor afirma que a Realidade não permite os paradoxos, não acontecem paradoxos em viagens no tempo. Harlan fica só com Twissell. Diz que descobriu que Mallansohn não poderia ter criado o Campo Temporal no século 24 porque precisaria da matemática do século 27. Deduziu que o Aprendiz Cooper irá ao 24 para ensinar a matemática necessária a Vikkor Mallansohn. Twissell diz que ele chegou bem perto da verdade. O Aprendiz Cooper é Mallansohn.
Capítulo 12. O início da eternidade.
Mallansohn deixou memórias, um volume que só poderia ser aberto por Computadores da Eternidade, três séculos depois. As memórias contavam que Cooper, nascido no século 78, treinado em matemática por Twissell, em História Primitiva por Harlan, foi enviado ao 24 para ensinar Mallansohn. Levou dois anos para encontrar Mallansohn; este evoluía lentamente na matemática e morreu. Cooper assumiu a identidade de Mallansohn e construiu o Campo Temporal. Somente três séculos depois foram criadas as equações matemáticas. Um círculo temporal. Nas memórias, Cooper não falava nada sobre as cápsulas de deslocamento na Eternidade. Depois que Cooper partir será a liberdade. Harlan pensa que pode destruir a Eternidade. Vão para uma sala com uma esfera, uma cápsula bem maior que o normal, para levar Cooper. Viagens espaciais são necessárias? Twissell mostra a nova cápsula e a sala de controle. Tranca Harlan na sala de controle.
Capítulo 13. Além do ponto de partida no tempo-abaixo.
Cooper irá para o 24, ano 2317. Últimas instruções para Cooper. Harlan se compara a Sansão; ingenuidade do autor. Envia-se a cápsula com Cooper, Twissell acha que tudo funcionou. Mas Harlan queimou os circuitos e enviou Cooper para bem antes do 24. Não haverá mais Eternidade.
Capítulo 14. O crime anterior.
Twissell conversa com Harlan no intuito de convencê-lo a ajudar na localização e resgate de Cooper. O Conselho não sabe das ilegalidades cometidas por Harlan, somente Twissell. Este conta seu próprio crime a Harlan: Twissell teve uma mulher no 575, ela ficou grávida, teve um bebê e morreu. Twissell ajudou na criação do bebê, com dinheiro. Viajou no tempo e conheceu o filho com 34 anos. Depois, fez uma Mudança de Realidade e o menino nasceu novamente, mas com deficiências. Culpa.
Capítulo 15. Busca através do Primitivo.
A alteração de ter enviado Cooper para o século errado é reversível. Harlan acha que o enviou para 1938. Ele procura algum anúncio nas revistas do século 20 que possa ser um recado de Cooper. Harlan encontra o anúncio, mas exige a presença de Noÿs e fala da barreira nos cem mil. Twissell vai com Harlan e consegue passar do cem mil, não havia barreira.
Capítulo 16. Os séculos ocultos.
Twissell imagina que a humanidade evoluída dos séculos ocultos não queiram a interferência dos Eternos e conseguem impedir a entrada e a até a passagem deles. Resgate de Noÿs e voltam para o 575. O anúncio de Cooper contém um desenho de bomba atômica em 1932, anacronismo. Harlan irá com Noÿs resgatar Cooper.
Capítulo 17. Fechando o círculo.
Harlan está com a mente perturbada. Preparação para ir ao século 20. Pretendem contactar Cooper pela caixa postal do anúncio. Desembarcam no Primitivo, 1932, junto à caverna de Cooper. Harlan encontra dinheiro deixado por Cooper na caverna. Noÿs percebe que Harlan está mudado. Ele desconfia dela. A barreira dos cem mil condicionou o comportamento dele, a intenção dele de destruir a Eternidade. Foi tudo planejado pelo pessoal dos séculos ocultos. Noÿs pertence aos séculos ocultos. Harlan ameaça bater nela; é chocante isso hoje. Ameaça matá-la “para proteger a Eternidade”, ele que antes pensava em destruir a Eternidade.
Capítulo 18. O início da infinidade.
Noÿs diz que ele quer matá-la porque se sente traído. As pessoas do século de Noÿs perceberam a existência da Eternidade e as mudanças provocadas. Sem a Eternidade, haveria o Estado Básico da Realidade. A Eternidade faz mudanças para ter mais segurança. Eles bloquearam os séculos ocultos para não sofrerem as alterações. A humanidade tentou se espalhar pela galáxia, mas o atraso causado pela Eternidade fez com que os planetas já estivessem dominados por outras civilizações. A humanidade definhou. A Eternidade provocou isso, com usa moderação, nada em excesso, segurança. Ao eliminar os desastres, eliminam-se as superações, os triunfos. Sem a Eternidade, a humanidade se desenvolveria e se espalharia pela galáxia com a energia atômica. Noÿs analisou diversas realidades e escolheu a única em havia Harlan. Quer viver com ele em 1932. Filhos e netos e alcançar as estrelas.
Observações:
Esse final traz duas curiosidades.
O final demonstra que a Realidade em que vivemos foi alterada por Noÿs e Harlan. Na “Realidade verdadeira”, aquilo que Noÿs chama de “Estado Básico”, a energia nuclear só começou a ser usada no século 30. Noÿs quer fazer uma pequena alteração para que a energia nuclear comece a ser usada em 1945 e, assim, fazer a humanidade evoluir mais rápido para as viagens espaciais. Cabe questionar a falta de ética, ou empatia, do autor, ao sugerir que vale a pena matar centenas de milhares de pessoas em troca de viagens espaciais.
O outro ponto – que até poderia resultar em uma continuação – é que, além de Harlan e Noÿs, o Aprendiz Cooper também ficou em 1932. E como ele é, também, Mallansohn, ele pode tentar desenvolver o tal Campo Temporal que deu início à Eternidade. Era necessário tapar esse furo na história; imaginar que Harlan e Noÿs tentarão convencer Cooper a não iniciar o Campo Temporal. E se Cooper for um fã da Eternidade, talvez resulte uma luta de vida e morte.