Pequeno-burgueses, Maksim Górki, 1902, 190 páginas, tradução de Lucas Simone, Hedra. Início: 14/02/2021 – Fim: 17/02/2021. Nota 2.
Aviso de spoiler: vou escrever sobre todo o enredo do livro,
continue por sua conta e risco.
Esta
peça de Górki ficou famosa em sua época, todavia hoje penso que perdeu impacto
e relevância.
Em
quatro atos, a peça conta alguns dias na vida de uma família comum em uma
cidade de província. O pai e a mãe não compreendem as atitudes dos filhos. Os
filhos se consideram mais inteligentes e atualizados que os pais. A casa é
cheia de gente, filhos, agregados, pensionistas, conhecidos. As brigas e
discussões são constantes.
Parece
“A grande família” ou “Sai de baixo” ou “Vai que cola”, sem o humor, somente
com as brigas.
Além
da incompreensão mútua entre quase todos os personagens, o fio de enredo é o
seguinte: Tatiana, 28 anos, professora, insatisfeita, passou da idade de casar,
gosta de Nil, 27 anos, maquinista de trem, agregado e “filho adotivo” da
família. Nil gosta de Pôlia, 21 anos, costureira, e a pede em casamento. Piôtr,
irmão de Tatiana, 26 anos, ainda estudante que foi expulso da universidade, insatisfeito,
sem rumo, gosta da viúva e festeira Eliêna, 24 anos. Ele receia se comprometer
com uma viúva alegre e os pais seriam contra.
Resultado:
Tatiana, ao saber do compromisso entre Nil e Pôlia tenta um ineficaz suicídio:
engole amoníaco e nada resulta disso. Tatiana fica pelos cantos. Piôtr enfim
rebela-se e diz que vai morar com Eliêna.
Isso
acontece no meio de brigas e gritos e discussões.
Górki
pretendia a crítica da pequena burguesia, ou seja da classe média. Ou seja, nas
palavras dele, “destruir os pontos de vista já estabelecidos sobre a vida e as
pessoas”. Todavia, o enredo, hoje, é atual e defasado ao mesmo tempo. Atual
porque pais e filhos sempre irão ter atritos e certo nível de incompreensão
mútua. Defasada porque dificilmente haveria problemas em um filho casar com uma
viúva; Tatiana poderia ficar amuada pelos cantos ao ser rejeitada, mas ter 28
anos, ser professora e não ser casada é até motivo de orgulho, hoje.
Ah,
a gente poderia dizer: Shakespeare, por exemplo, é totalmente anacrônico, nem existem
mais reis e príncipes, batalhas e castelos e bruxas. Mas Shakespeare e
Eurípides conseguem ser ainda atuais porque as questões inseridas nas peças
deles são universais: amor intenso, traição, fúria, loucura, suicídios, assassinatos
por ambição e por vingança, e assim por diante.
Ao
retratar brigas comezinhas no interior de uma família, Górki não alcança profundidade
e perenidade.