O retrato de Dorian Gray, Oscar Wilde, 1890

O retrato de Dorian Gray, Oscar Wilde, 1890, 224 páginas, tradução de Alexandre Barbosa de Souza, Via Leitura. Início: 08/12/2020 - Fim: 16/12/2020.

Aviso de spoiler: em geral, escrevo sobre todo o enredo do livro, continue por sua conta e risco. 

Havia lido este livro muito cedo na vida, adolescência, e não recordava detalhes, mas sabia o geral da história. Ou sabia pela cultura popular, pois a história do retrato que envelhece no lugar do retratado é de amplo conhecimento. 

É um livro relevante, deve ser lido e vale a pena ser lido. É um livro irregular. 

O pintor Basil Hallward está terminando o retrato do jovem Dorian Gray, que posa para ele, na presença de Lorde Henry Wotton. Henry é um cético e um cínico e faz ver a fatuidade da juventude ao ingênuo Dorian. Ao ver o quadro terminado, a beleza de seus traços jovens perfeitamente representados e preservados, Dorian diz que daria a alma para permanecer jovem enquanto o retrato envelheceria. De algum modo misterioso, a permuta é aceita. O jovem percebe a primeira modificação no quadro e se assusta terrivelmente, pensa em ser bom e virtuoso, mas daí por diante suas maldades, infâmias, pecados e crimes se multiplicam. Passam-se os anos. Dorian, com trinta e oito anos continua a parecer um jovem de vinte. O retrato, por outro lado, está cada vez mais hediondo: a imagem não apenas envelhece, mas também exibe a maldade acumulada do rapaz. Cruel e covarde, Dorian mata Basil, o pintor que fez o quadro, atribuindo ao artista a culpa por seu destino. Pouco tempo depois, desiludido com sua própria capacidade de se tornar virtuoso, Dorian ataca o quadro com uma faca. Os criados ouvem o grito e sobem, o quadro mostra um Dorian Gray jovem e belo, enquanto jaz no chão um homem envelhecido e terrível com uma faca no coração. 

O livro tem cenas muito divertidas com Lorde Henry e seus epigramas amorais, espirituosos e sua visão cínica dos seres humanos e da sociedade. Dorian Gray oscila entre a ingenuidade e a perversidade. As infâmias, as perversões, as maldades, praticadas por Dorian não são descritas. De acordo com Wilde, cada um de nós deve ver seus próprios pecados em Dorian Gray. O final do livro me parece excessivamente moralista; não parece combinar com a ausência de escrúpulos do personagem – na maior parte do tempo – e na contínua pregação de Lorde Henry, um alter ego de Wilde. Dorian Gray, criminoso, hedonista e sempre impune não teria motivos tão fortes para destruir a magia de sua permanente juventude. Talvez o cansaço, talvez já ter experimentado todas as perversões, talvez ele não esperasse que a tentativa de destruição do retrato resultaria em sua própria morte. 

Lorde Henry pode ser visto como um demônio, visto que é por meio de sua “filosofia” de vida que Dorian Gray sugere trocar a alma pela juventude. É estranho não haver um pacto formal que conceda a Dorian o que ele desejou. Também incomoda ao leitor o fato de que ninguém faz observações acerca da disparidade entre a idade de Dorian, 38 anos, e a sua aparência eterna. Somente no penúltimo capítulo, Lorde Henry pergunta qual o segredo da juventude do rapaz. 

Resumo: 

Capítulo I. Lorde Henry Wotton e o pintor Basil Hallward conversam sobre pintura, sociedade, e sobre Dorian Gray, um rapaz que o pintor conhecera e que estava servindo de modelo a um quadro. Basil sente necessidade da amizade de Dorian e o vê todos os dias. 

Capítulo II. Dorian Gray chega ao estúdio de Basil para posar. Lorde Henry fala para Dorian sobre a juventude e a tragédia do envelhecimento. Basil termina o quadro e Dorian diz que daria a alma para permanecer jovem e somente o quadro envelhecer. Henry e Dorian combinam de ir ao teatro à noite e saem do estúdio. 

Capítulo III. Lorde Henry visita o tio, Lorde Fermor, para saber mais sobre a família de Dorian Gray. A mãe do rapaz, Margaret Devereux fugiu para casar com um rapaz pobre, o pai dela, Lorde Kelso, mandou matar o genro, ela teve o bebê e morreu pouco depois, Dorian foi criado pelo avô. Henry vai almoçar com tia Agatha, Dorian Gray já está lá, outros da sociedade, aforismos e ditos espirituosos, pilhérias sobre os norte-americanos. 

Capítulo IV. Dorian Gray conhece a esposa de Lorde Henry. Declara estar apaixonado por Sibyl Vane, atriz, pobre, faz papéis de Julieta e de Desdêmona, entre outros. No final do capítulo, anuncia que vai se casar com Sibyl. 

Capítulo V. Na casa de Sibyl Vane, ela feliz, feliz; a mãe, atriz fracassada, resmungona, interesseira; o irmão James vai embarcar para a Austrália, ele e Sibyl passeiam no parque, passa Dorian em uma carruagem. 

Capítulo VI. Lorde Henry, Basil Hallward e Dorian Gray jantam juntos e conversam sobre o casamento. Chegam ao teatro para ver Sibyl. 

Capítulo VII. Sibyl interpreta pessimamente o papel de Julieta. Lorde Henry e Basil retiram-se. Dorian vai ao camarim e humilha a moça, diz que não a ama mais. A moça explica que não conseguira interpretar o papel porque agora ama na realidade e o palco perdeu a força da ilusão para ela. Dorian passa a noite pela rua, vai para casa e o retrato se modificou, adquirindo as marcas da maldade de Dorian. 

Capítulo VIII. Dorian acorda tarde, confirma que o retrato se alterou, escreve uma carta apaixonada para Sibyl. Lorde Henry chega e conta que Sibyl morreu, suicídio com ácido. Dorian considera o fato uma tragédia maravilhosa, ópera à noite. 

Capítulo IX. Visita de Basil, que pensa que Dorian estava abalado, mas que nada. O biombo esconde o quadro, Basil quer ver, Dorian diz que ele nunca vai ver o quadro de novo, e decide esconder o quadro. 

Capítulo X. Dois homens levam o quadro para o sótão, a chave fica com Dorian. A investigação conclui que a morte de Sibyl foi acidental. Ele recebe um livro que o interessa sobre um parisiense que experimenta todos os pecados e paixões, seja lá o que isso for. Jantar com Henry. 

Capítulo XI. Longo e tedioso, as ocupações de Dorian ao longo dos anos, desnecessário, o quadro continua piorando. 

Capítulo XII. Dorian faz 38 anos no dia 10 de novembro. Basil visita-o preocupado com todos os boatos que correm, está de partida para Paris. Dorian vai mostrar a Basil sua verdadeira “alma”. 

Capítulo XIII. Sobem ao sótão e Dorian mata Basil em frente ao retrato. 

Capítulo XIV. Dorian manda chamar Alan Campbell, químico, que tem um laboratório particular, conta o assassinato, faz uma chantagem misteriosa e obriga Campbell a fazer o corpo desaparecer, lá no sótão, com química e fogo. 

Capítulo XV. Jantar com Henry na casa de Lady Narborough. Dorian destrói objetos de Basil na lareira, sente necessidade de ópio, sai de casa. 

Capítulo XVI. Casa de ópio nos cafundós perto do rio. Dorian encontra Adrian Singleton ao qual destruiu, assunto de um desfalque ou falsificação; uma mulher o chama de Príncipe Encantado. O marinheiro James Vane ouve, vai atrás dele e vai matá-lo, mas Dorian diz que é muito jovem para ter sequer conhecido Sibyl Vane, e James o liberta. Depois, a mulher diz a James que Dorian não envelhece e que a destruiu faz dezoito anos. 

Capítulo XVII. Dorian na propriedade Selby Royal com muitos convidados. Dorian vê o rosto de James Vane no vidro do orquidário e desmaia. 

Capítulo XVIII. Durante uma manhã de caçada em Selby Royal, Lorde Geoffrey atira em uma lebre e mata um homem. Esse homem era James Vane e Dorian se sente salvo. 

Capítulo XIX. Dorian quer se tornar bom, poupou a jovem camponesa Hetty de ser desonrada. Conversa com Lorde Henry sobre o desaparecimento de Basil, o suicídio de Alan Campbell em seu laboratório. 

Capítulo XX. O retrato está mais e mais horrendo e há mais sangue. A decisão de Dorian de se tornar bom não afetava o retrato, a decisão era hipocrisia, vaidade, curiosidade. Dorian ataca o retrato com a faca. Um grito pavoroso. Os empregados sobem e veem o retrato esplêndido de um rapaz jovem e belo e, no chão, um homem morto com uma faca no coração, “seco, enrugado, com um rosto odioso. Só quando examinaram seus anéis reconheceram quem era.”