Isabel: "Amanhã tem clube de leitura, era para ler alguns contos de Lispector, Clarice, do livro “Laços de família”, eu li quase todos, nunca havia me interessado pela obra dela, e depois de ler esses poucos contos, considero supervalorizada. Os contos são medianos, alguns desinteressantes, alguns bons. Na seara dos contos, muito aquém de, apenas como exemplo, Munro, Alice. Um monte de mulher oprimida pela vida de dona de casa. Não dava para imaginar outras histórias, interrogação. Sim, eu me sinto próxima daquelas mulheres, além de dona de casa, mãe, funcionária, esposa, angustiada, agoniada, insatisfeita, sem saída, sim, sou tudo isso, mas não amei os contos, não se acertaram comigo. No clube, não sei se vou dizer o que achei, às vezes fico calada quase todo o tempo da reunião, tenho vergonha dos meus pensamentos. Quem sabe. Eu sei, que queria ser outra pessoa, mas se eu fosse a outra pessoa, eu teria outro conglomerado abrangente de queixas. Quem sabe. Às vezes, acho que não, que sim. Eu vejo aquela moça que trabalha com livros, eu gostaria sim, eu trabalho com a aridez das leis, o que eu escrevo é “conforme”, “de acordo”, “ademais”, “concomitantemente”, “portanto”, “artigo”, “haja vista”, “inciso”, “parágrafo”. Na juventude, a gente faz muita merda, eu achava bonito as leis, pensava que ia ser juíza e corrigir o mundo. Quase todo mundo é assim, o jovem estudante de engenheiro, como meu marido, pensa que vai construir pontes magníficas, até ligar continentes, depois cai na real, cai no mundo do dinheiro, faz qualquer funçãozinha subalterna na engenharia e levando esporro dos superiores. É assim. Vai demorar muito tempo para que eu dê outra chance a Lispector. Decepcionante."