Notas sobre Romeu e Julieta, de William Shakespeare

Notas sobre Romeu e Julieta, de William Shakespeare 
Paulo Mendes 

Romeu e Julieta, William Shakespeare (1594) 

Todo mundo conhece a história famosa, mesmo sem ter lido sequer uma linha da peça. Resumo resumido: jovens de famílias inimigas se apaixonam, casam em segredo e se suicidam devido a uma falha de comunicação. 

Resumo expandido. As famílias Montéquio (Montague) e Capuleto (Capulet) são inimigas, como tantas no interior do Nordeste do Brasil. Romeu Montéquio conhece Julieta Capuleto em uma festa na casa do pai dela e trocam dois beijos. O Conde Páris é um ilustre pretendente a casar com Julieta. Todavia, o Frei Lourenço celebra, em segredo, o casamento dos recém-apaixonados. A seguir, em uma briga de rua entre as famílias inimigas, Mercutio, amigo de Romeu é morto, e este mata Tybalt, um Capuleto. O Príncipe de Verona ordena o exílio de Romeu e ele foge para Mântua. O pai de Julieta providencia o casamento dela com Paris. Desesperada, ela pede conselho ao Frei Lourenço. O Frei dá a Julieta uma poção que simulará a morte dela por quarenta e duas horas, mas, ao final do efeito, a moça despertará. O plano é que, após colocarem o corpo de Julieta no jazigo da família, ela desperte e possa fugir com Romeu. Para isso, o Frei enviará carta a Romeu contando do plano e pedindo a presença dele. Julieta toma a poção e todos a consideram morta. Ela é levada ao jazigo. A carta do Frei não chega a Romeu. No ínterim, um amigo de Romeu viaja para Mântua e o informa da morte da amada. Romeu compra um forte veneno e volta a Verona para se matar junto ao corpo da moça. No jazigo dos Capuleto, ele encontra com o Conde Páris; eles brigam e Romeu o mata. Frente ao corpo de Julieta, Romeu toma o veneno e morre. Julieta desperta e se desespera com a morte do rapaz. O Frei Lourenço chega e tenta consolá-la. Entretanto, Julieta toma a adaga de Romeu e se mata. As famílias e o Príncipe se reúnem no jazigo e determinam o fim da inimizade. O Príncipe declara que nunca houve história tão triste quanto a de Julieta e Romeu. 

Romeu e Julieta é uma peça que sempre evitei ler porque achava que seria tola demais, romântica demais. Contudo, apesar do romantismo exacerbado do casal, a peça é fácil de ler, muito divertida e interessante. É notável que, apesar de todas as partes cômicas, o autor anuncia a tragédia diversas vezes por meio de falas em que os personagens citam a morte. 

Quem lê a peça pela primeira vez pode ficar admirado com alguns aspectos da trama: (1) a peça parece uma comédia, na maior parte do tempo, (2) Romeu já começa a peça perdidamente apaixonado, mas não por Julieta que ainda irá conhecer na festa, (3) a grande quantidade de alusões sexuais e (4) a tenra idade de Julieta, apenas treze anos. 

Como em todas as peças de WS que conheço, há muitas cenas divertidas e picantes, bem como trocadilhos e palavrões. Shakespeare sempre mesclava momentos de tensão com momentos leves, mesmo nas tragédias, e aqui há longos trechos cômicos, em especial com Mercutio e com a Ama de Julieta. Uma das personagens mais fascinantes é a Ama. A maior parte das cenas em que ela participa é revestida de comicidade, exceto quando ela encontra a garota aparentemente morta. 

A idade da garota impressiona o leitor de hoje: Julieta tem treze anos e faltam alguns dias para completar quatorze. Sabemos que era costume as pessoas casarem cedo, especialmente as mulheres, mas a tenra idade assusta. Entretanto, é dito na peça que há, em Verona, moças mais jovens que Julieta e que já são mães felizes. De todo modo, as falas da personagem não correspondem à idade dela, a não ser quanto à ingenuidade do amor imediato, infinito e romântico. 

A idade de Romeu não é declarada na peça, mas se pode deduzir que é um jovem rapaz. É importante destacar o Romeu tolamente apaixonado do início, sofrendo pelo amor de outra moça, Rosaline, que não lhe corresponde. Rapidamente, tal paixão vai desaparecer (ou ser desviada) quando ele conhece a filha dos Capuleto, revelando a volatilidade e a impetuosidade das paixões juvenis. 

Parafraseando Tatiana Feltrin, em um de seus vídeos no Youtube, é ridículo que, atualmente, pessoas escrevam cartas sobre amor e dificuldades amorosas para uma menina de treze anos que trocou dois beijos com um rapaz, casou no dia seguinte e se matou dois dias depois. Evidentemente, tal menina, se houvesse exisitido, não teria nada naquela cabecinha oca, tampouco conselhos a dar. Ademais, Julieta não existiu e a casa em Verona é tão somente uma tola ficção para turistas desavisados. Acerca de um tal filme sobre cartas para a menina bobinha, eu não consegui assistir nem dois minutos daquela papagaiada. 

Mas, voltemos: a peça do Bardo é divertida e trágica, o amor dos jovens apaixonados é ingênuo, volátil, desesperado, é tudo ou nada, infantil, é quero porque quero. 

Vale muito a pena conhecer a peça na forma como escrita pelo Bardo e não apenas pelo que sabemos de ouvir dizer, de imaginar, ou de trechos de filmes e adaptações. 

A edição da Penguin Companhia é muito boa, como todas as edições deste selo. A introdução de Adrian Poole, entre outros pontos, destaca os “duplos” da peça: a Ama e Mercutio vistos como a consciência brincalhona e impudica de Julieta e de Romeu, respectivamente; Frei Lourenço e o apotecário vistos como especialistas em poções, um benéfico e o outro malfazejo. 

A tradução é boa, sim, e permite a leitura rápida e fluida da peça. Há, no original, muitos trocadilhos e piadas intraduzíveis ou incompreensíveis hoje, e o tradutor adaptou tudo isso, com brilho e sem perder o contexto. Naturalmente, uma tradução nunca agradará a todos. Como já escrevi algumas vezes, prefiriria uma tradução que não se prendesse a métrica e rima, porque, para mim, é mais importante conhecer as frases reais compostas pelo Bardo. Na tradução de José Francisco Botelho, as frases são modificadas para acompanhar os versos do autor: não perdem o sentido, mas não é o mais próximo possível da escrita original de WS. Abaixo, nos trechos selecionados, mostro um único exemplo de cotejamento entre o original em inglês, uma tradução mais literal, minha, e a tradução de Botelho. Além das questões de tradução, não gostei de se denominar o farmacêutico (apotecário, apothecary em inglês) de “herbanário”, e das versões dos nomes de Mercutio (Mercúcio) e Tybalt (Teobaldo). Idiossincrasias minhas. 

Infelizmente, a capa desta edição é muito feia, convenhamos, mesmo sendo uma foto de Annie Leibovitz; nem mesmo fotógrafos famosos estão livres de fazer uma foto ruim. 

Enfim, uma obra excepcional que merece ser conhecida diretamente, não apenas a partir da cultura popular, da qual faz parte de forma indissociável. Espero que os trechos selecionados, escolhidos e traduzidos por mim, mostrem um pouco da excelência de William Shakespeare. 




Trechos (com minha tradução sem rima e sem métrica): 

É curioso que o coro, logo no início da peça, já conta toda a história. 

Coro: 
Duas famílias, iguais em dignidade, 
Na bela Verona, onde colocamos o cenário, 
Do antigo rancor ao novo escarcéu, 
No qual o sangue cidadão torna impuras as mãos cidadãs. 

Filhos dos lombos fatais desses dois inimigos 
Um par de amantes desaventurados tira a própria vida; 
Esta ruína infeliz e comovente, 
Tal morte, fez sepultar a contenda de seus pais. 

A passagem terrível desse amor funesto, 
E a contínua inimizade entre as famílias, 
Que nada poderia remover, exceto o final trágico dos filhos, 
Mostramos agora, durante duas horas em nosso palco; 

O que faltou, se você tem ouvidos pacientes para escutar, 
Nosso trabalho vai se esforçar para completar. 

Chorus: 
Two households, both alike in dignity, 
In fair Verona, where we lay our scene, 
From ancient grudge break to new mutiny, 
Where civil blood makes civil hands unclean. 
From forth the fatal loins of these two foes 
A pair of star-cross’d lovers take their life; 
Whose misadventur’d piteous overthrows 
Doth with their death bury their parents’ strife. 
The fearful passage of their death-mark’d love, 
And the continuance of their parents’ rage, 
Which, but their children’s end, nought could remove, 
Is now the two hours’ traffic of our stage; 
The which if you with patient ears attend, 
What here shall miss, our toil shall strive to mend. 


Romeu: 
O amor é uma fumaça feita com o vapor dos suspiros; 
se for honesto, é um fogo brilhando nos olhos dos amantes, 
se frustrado, é um mar alimentado com lágrimas amorosas. 
O que mais? Uma loucura discreta, 
um fel asfixiante, e um carinho guardado. 

Romeo: 
Love is a smoke made with the fume of sighs, 
Being purg’d, a fire sparkling in lovers’ eyes, 
Being vex’d, a sea nourish’d with loving tears. 
What is it else? a madness most discreet, 
A choking gall, and a preserving sweet. 

A seguir, a tradução de José Francisco botelho para o mesmo trecho, como está na edição Penguin. 

Romeu: 
O amor é fumo aceso em ventos suspirantes; 
se satisfeito, brilha – um fogo entre os amantes; 
negado, vira um mar de tormentoso pranto. 
E o que mais é o amor? Discreta insanidade; 
é fel que engasga o peito e é doce amenidade. 
(Tradução de José Francisco Botelho). 


Tais frases de amor de Romeu, no início da peça, não são para Julieta e sim para uma tal de Rosaline, uma moça que não se interessa por ele. 

Romeu: 
Ora, eu perdi a mim mesmo, eu não estou aqui: 
este não é Romeu, ele está em algum outro lugar. 

Romeo: 
Tut, I have lost myself, I am not here: 
This is not Romeo, he’s some other where. 


O Conde Páris pediu a mão de Julieta e quer uma resposta de Capuleto, o pai. 

Capuleto: 
Respondo o que já disse antes: 
minha criança é ainda uma estrangeira no mundo, 
ela nem viu a mudança para quatorze anos; 
deixemos mais dois verões murcharem suas vaidades, 
antes que pensemos que ela está madura para ser uma noiva. 

Páris: 
Mais jovens que ela já se tornaram mães felizes. 

Capulet: 
But saying o’er what I have said before: 
My child is yet a stranger in the world, 
She hath not seen the change of fourteen years; 
Let two more summers wither in their pride, 
Ere we may think her ripe to be a bride. 

Paris: 
Younger than she are happy mothers made. 


Lady Capuleto fala com Julieta sobre casamento: 
Casamento, casamento, este é o vero tema que venho te falar. 
Diga-me, filha, como está tua disposição para casar? 

Julieta: 
É uma honra com a qual eu não sonho. 

[...] 

Lady Capuleto: 
Pois pense, sim, em casamento agora; mais jovens que tu, 
aqui em Verona, senhoras de respeito 
já se tornaram mães. Pelas minhas contas, 
eu era tua mãe antes desses anos 
em que és, ainda, uma virgem. Curto e rasteiro: 
o valoroso Páris te quer para esposa. 

Lady Capulet: 
Marry, that ‘marry’ is the very theme 
I came to talk of. Tell me, daughter Juliet, 
How stands your dispositions to be married? 

Juliet: 
It is an honor that I dream not of. 

[...] 

Lady Capulet: 
Well, think of marriage now; younger than you, 
Here in Verona, ladies of esteem, 
Are made already mothers. By my count, 
I was your mother much upon these years 
That you are now a maid. Thus then in brief: 
The valiant Paris seeks you for his love. 


Romeu e Mercutio conversam. 

Romeu: 
O amor é algo terno? É muito duro, 
muito rude, muito turbulento, e fura como um espinho. 

Mercutio: 
Se o amor é duro contigo, seja duro com o amor, 
fure o amor por diversão e derrotarás o amor. 

Romeo: 
Is love a tender thing? It is too rough, 
Too rude, too boist’rous, and it pricks like thorn. 

Mercutio: 
If love be rough with you, be rough with love; 
Prick love for pricking, and you beat love down. 


Romeu e Julieta se conhecem na festa dos Capuleto, trocam dois, somente dois, beijos e se apaixonam “perdidamente”, sem sequer saberem quem são. 

Romeu: 
Ela é uma Capuleto? Tenho agora uma dívida querida, minha vida pertence ao meu inimigo. 

Romeo: 
Is she a Capulet? O dear account! my life is my foe’s debt. 

[...] 

Julieta: 
Vai, pergunta o nome dele. Se for casado, 
o túmulo será meu leito nupcial. 

Ama: 
Seu nome é Romeu, e é um Montéquio, 
o único filho de teu grande inimigo. 

Julieta: 
Meu único amor brotou de meu único ódio! 
Muito cedo visto como um desconhecido, e descoberto muito tarde! 
Prodigioso nascimento do amor é este, 
devo amar um inimigo odiento. 

Juliet: 
Go ask his name. If he be married, 
My grave is like to be my wedding-bed. 

Nurse: 
His name is Romeo, and a Montague, 
The only son of your great enemy. 

Juliet: 
My only love sprung from my only hate! 
Too early seen unknown, and known too late! 
Prodigious birth of love it is to me 
That I must love a loathed enemy. 


Trechos da cena famosa em que Romeu está no jardim e Julieta na janela. 

Julieta: 
Romeu, Romeu, por que tu és Romeu? 
Nega o teu pai e renuncia ao teu nome. 
Ou, se não quiseres, mas jurares meu amor, 
eu não serei mais uma Capuleto. 
[...] 
Afinal, o que é Montéquio? Não é uma mão nem um pé, 
um braço ou um rosto, nem qualquer outra parte, 
pertencente a um homem. Oh, Romeu, torne-se algum outro nome. 
O que há em um nome? Aquilo que chamamos rosa, 
com qualquer outro nome teria o mesmo perfume. 

Juliet: 
O Romeo, Romeo, wherefore art thou Romeo? 
Deny thy father and refuse thy name; 
Or, if thou wilt not, be but sworn my love, 
And I’ll no longer be a Capulet. 
[...] 
What’s Montague? It is nor hand nor foot, 
Nor arm nor face, nor any other part 
Belonging to a man. O, be some other name! 
What’s in a name? That which we call a rose 
By any other word would smell as sweet; 

[...] 

Romeu tenta fazer juras, mas é cortado por Julieta, menos etérea do que ele. 

Julieta: 
Romeu, não jures pela lua, essa inconstante lua, 
que sempre muda em sua órbita circular, 
a menos que o teu amor se mostre igualmente mutável. 

Romeu: 
Devo jurar pelo quê? 

Julieta: 
Não jures, afinal,
ou se quiseres, jures por teu gracioso ser, 
que é o deus de minha adoração, 
e eu acreditarei em ti. 

Juliet: 
O, swear not by the moon, th’ inconstant moon, 
That monthly changes in her circled orb, 
Lest that thy love prove likewise variable. 

Romeo: 
What shall I swear by? 

Juliet: 
Do not swear at all; 
Or if thou wilt, swear by thy gracious self, 
Which is the god of my idolatry, 
And I’ll believe thee. 


Julieta se despede, boa noite. 

Romeu: 
Vais me deixar, então, insatisfeito? 

Julieta: 
Que satisfação podes ter esta noite? 

Romeo: 
O, wilt thou leave me so unsatisfied? 

Juliet: 
What satisfaction canst thou have to-night? 

*

Cena cômica: a Ama chega da rua com recado de Romeu, mas fica fazendo cena para dar o recado, e Julieta se consome de ansiedade. 

Julieta: 
Como estás sem fôlego se tens fôlego 
para me dizer que estás sem fôlego? 

Juliet: 
How art thou out of breath, when thou hast breath 
To say to me that thou art out of breath? 

Enfim, a Ama o transmite recado de Romeu, mas com alusões sexuais. 

Ama: 
Então, corra para a cela de Frei Lourenço, 
há lá um marido para te fazer de esposa. 
Agora vejo o sangue luxurioso em tuas bochechas, 
elas ficam vermelhas com qualquer notícia. 
Corra para a igreja, eu vou para outro lado, 
arranjar uma escada, pois teu amor 
deve escalar o ninho do passarinho logo que escurecer. 
Eu faço o trabalho pesado para o teu deleite, 
mas tu quem vais suportar a carga logo mais à noite. 
Vai, eu vou jantar, corra para a cela. 

Nurse: 
Then hie you hence to Friar Lawrence’ cell, 
There stays a husband to make you a wife. 
Now comes the wanton blood up in your cheeks, 
They’ll be in scarlet straight at any news. 
Hie you to church, I must another way, 
To fetch a ladder, by the which your love 
Must climb a bird’s nest soon when it is dark. 
I am the drudge, and toil in your delight; 
But you shall bear the burthen soon at night. 
Go, I’ll to dinner, hie you to the cell. 


Frei Lourenço aconselha Romeu: 
Esses prazeres violentos têm finais violentos, 
e em seu triunfo morrem, como fogo e pólvora, 
que se beijam e se consomem no mesmo instante. O mel mais doce 
é repugnante em sua própria gostosura, 
e seu sabor confunde o apetite. 
Portanto, amem moderamente: o amor duradouro é assim; 
quem vai muito rápido chega tão atrasado quanto o muito lento. 

Friar Lawrence: 
These violent delights have violent ends, 
And in their triumph die, like fire and powder, 
Which as they kiss consume. The sweetest honey 
Is loathsome in his own deliciousness, 
And in the taste confounds the appetite. 
Therefore love moderately: long love doth so; 
Too swift arrives as tardy as too slow. 

O frei não confia em deixar fogo e pólvora juntos. 

Frei Lourenço: 
Venham, venham comigo, vamos fazer uma cerimônia curta, 
garanto que não ficarão sozinhos 
até que a Santa Igreja incorpore dois em um. 

Friar Lawrence: 
Come, come with me, and we will make short work, 
For by your leaves, you shall not stay alone 
Till Holy Church incorporate two in one. 


Antes da luta fatal com Tybalt, Romeu se diz enfraquecido por amar Julieta; é sensação semelhante àquela da qual fala o general Otelo acerca do amor por Desdêmona. Romeu prevê dias funestos. 

Romeu: 
[...] Doce Julieta, 
tua beleza tornou-me afeminado, 
e em meu temperamento suavizou-se o aço da bravura! 

Romeo: 
[...] O sweet Juliet, 
Thy beauty hath made me effeminate, 
And in my temper soft’ned valor’s steel! 

Romeu: 
Este dia de fatal destino contamina o futuro, 
tal desgraça vai chegar a muitos outros dias. 

Romeo: 
This day’s black fate on moe days doth depend, 
This but begins the woe others must end. 

Lady Capuleto: 
Imploro por justiça que tu, Príncipe, deve conceder: 
Romeu matou Tybalt, Romeu não deve viver. 

Lady Capulet: 
I beg for justice, which thou, Prince, must give: 
Romeo slew Tybalt, Romeo must not live. 


Amanhece, depois da noite que os amantes passaram juntos; Romeu tem que fugir de Verona. 

Romeu: 
Mais luz e luz, mais sombrios nossos infortúnios. 

Romeo: 
More light and light, more dark and dark our woes! 


Julieta tomou a poção do frei e parece morta. Este trecho da peça traz um tema curioso para a tradução. O personagem Capuleto se refere à Morte (Death) no masculino. Em algumas culturas e línguas, a personificação da Morte é masculina, em outras a Morte é vista como mulher. Nós a percebemos como mulher, bem como os mexicanos (La Catrina, la muerte) e franceses (la mort, la petite mort). Em inglês, a princípio, o substantivo morte é “it”, sem gênero, mas é comum o uso de “he”, masculino. O Bardo escolheu a Morte no masculino e as frases de Capuleto só fazem sentido assim, por conta das alusões sexuais: ele, “o” Morte, deitou com Julieta, deflorou-a, casou com ela, tornou-se o genro e herdeiro de Capuleto. Por este motivo, optei traduzir Death por Senhor Morte, embora haja outras soluções. José Francisco Botelho, por exemplo, escolheu “o anjo da morte”; não gostei dessa opção porque “anjo” não é uma palavra que implique uma ação sexual. 

Capuleto: 
Deixem-me vê-la. Ela está fria, 
seu sangue está paralisado e suas articulações rígidas; 
a vida e estes lábios foram separados de há muito. 
O Senhor Morte deitou sobre ela como uma geada prematura 
sobre a mais doce flor de todos os campos. 

[...] 

Frei Lourenço: 
A noiva está pronta para ir à igreja? 

Capuleto: 
Pronta para ir e nunca retornar. 
Oh, filho, na noite anterior ao dia do casamento, 
o Senhor Morte deitou com tua esposa. Lá está ela. 
Ela era uma flor e foi por ele deflorada. 
O Senhor Morte é o meu genro agora, e meu herdeiro, 
minha filha se casou com ele. Eu morrerei 
e lhe deixarei tudo: a vida, o viver, tudo é da Morte. 

Capulet: 
Hah, let me see her. Out alas, she’s cold, 
Her blood is settled, and her joints are stiff; 
Life and these lips have long been separated. 
Death lies on her like an untimely frost 
Upon the sweetest flower of all the field. 

[...] 

Friar Lawrence: 
Come, is the bride ready to go to church? 

Capulet: 
Ready to go, but never to return. 
O son, the night before thy wedding-day 
Hath Death lain with thy wife. There she lies, 
Flower as she was, deflowered by him. 
Death is my son-in-law. Death is my heir, 
My daughter he hath wedded. I will die, 
And leave him all; life, living, all is Death’s. 


Antes da chegada de Baltazar com notícias funestas de Verona, Romeu teve um sonho. 

Romeu: 
Se posso confiar na verdade lisonjeira do sono, 
meus sonhos pressagiam alvissareiras notícias em breve. 
[...] 
Eu sonhei que minha amada chegava e me encontrava morto – 
sonho esquisito, aquele que dá a um homem morto a capacidade de pensar! 

Romeo: 
If I may trust the flattering truth of sleep, 
My dreams presage some joyful news at hand. 
[…] 
I dreamt my lady came and found me dead – 
Strange dream, that gives a dead man leave to think! 


Romeu insiste com o apotecário para que lhe venda o veneno. 

Romeu: 
A fome está na tua face, 
necessidade e opressão esfomeiam teus olhos, 
desprezo e penúria pesam sobre tuas costas. 
O mundo não é teu amigo, tampouco as leis do mundo, 
o mundo não faz lei para te enriquecer; 
então, não sejas pobre, quebra as leis e toma este ouro. 

Romeo: 
Famine is in thy cheeks, 
Need and oppression starveth in thy eyes, 
Contempt and beggary hangs upon thy back; 
The world is not thy friend, nor the world’s law, 
The world affords no law to make thee rich; 
Then be not poor, but break it, and take this. 


Lady Capuleto ao ver os jovens amantes mortos: 
Oh Deus, esta visão fatal é como um sino 
que encaminha minha velhice à sepultura. 

Lady Capulet: 
O me, this sight of death is as a bell 
That warns my old age to a sepulchre. 


Amanhece e o Príncipe de Verona encerra a peça: 
Esta manhã traz uma paz sombria, 
o sol, entristecido, não mostrará sua face. 
Precisamos saber mais sobre esses infaustos acontecimentos. 
Alguns serão perdoados e alguns punidos: 
pois, nunca houve uma história mais infeliz 
que esta de Julieta e do seu Romeu. 

Prince Escalus: 
A glooming peace this morning with it brings, 
The sun, for sorrow, will not show his head. 
Go hence to have more talk of these sad things; 
Some shall be pardon’d, and some punished: 
For never was a story of more woe 
Than this of Juliet and her Romeo.