Três sonhos na mesma noite. A vida nos
sonhos é inteiramente real. O primeiro sonho: estava em um pequeno grupo que
fugia de um exército – isso deve vir desses filmes de guerra – a gente entrava
em uma imensa igreja antiga vazia, semidestruída. Sabia que a fuga devia ser por
uma escada larga de madeira que conduzia ao coro, aquela plataforma que fica no
começo da nave, atrás dos fiéis. Subimos correndo, chegamos ao coro que estava
sem balaustrada. Era somente a plataforma, também de madeira. A gente sabia que
ali, na frente do coro, sabia que aquele espaço vazio a partir do coro era um
portal. Ele transportava para outro tempo e lugar. Necessário se jogar sem medo
no vazio. Fizemos isso. Há algo de suicídio nessa solução. Nos jogamos, eu me
joguei e vi os outros se jogando. Nesse momento, fiquei no ar. O adjetivo que
encontro vem dos livros: inefável. Inefável: que causa imenso prazer;
inebriante, delicioso, encantador. Inefável: o que não se pode expressar com
palavras. Na vida fora dos sonhos, nunca senti isso. Ali, no sonho, suspenso no
ar, aquela sensação deliciosa, tudo resolvido, nenhuma dor, flutuação, via os
outros também no ar. Não sei para onde fomos transportados.
O segundo sonho: Isabel e eu estávamos em
um barco a vela, havia algum problema, não sei qual, a gente já perto de uma
enseada, ancoramos o barco. Na praia, um casal que era o dono de uma mansão à
beira-mar, eu sabia que eram os donos, em sonhos a gente sabe coisas que não
foram proferidas. O casal acenava para nós. Pegamos o barquinho a motor e fomos
para a praia. O casal excessivamente simpático nos convidava para ficar
hospedados na mansão. Na praia, descemos do barquinho e mergulhamos nas ondas.
Percebemos que as ondas eram estranhas. Melhor: a onda era sempre a mesma. Naquele
lugar, o tempo estava preso em um mesmo momento, aquele momento ia e voltava. A
onda quebrava e voltava e quebrava de novo. Era muito estranho. Quando olhei
para o nosso barco ancorado, vi uma onda enorme que se aproximava do barco,
ameaçando virá-lo, mas não virava, pois a onda voltava e vinha de novo. Caminhamos
para a mansão e, na entrada do jardim, havia três ou quatro guardas armados. Fiquei
com medo. Os donos simpáticos disseram para não nos preocuparmos, a gente não
estava preso ali, a gente podia sair quando quisesse, os guardas eram para
evitar intrusos. Entramos na mansão receosos de nunca mais poder sair.
O terceiro sonho: eu fazia parte de um
grupo de viajantes do tempo. A gente havia acabado de chegar no passado e no
lugar da nossa tarefa. Discutimos a missão, desenhamos estratégias em mapas e papéis.
A gente devia evitar que uma mulher viesse a conhecer seu futuro marido naquele
dia, 15 de maio de não sei qual ano. Era necessário evitar o encontro dos dois,
mesmo que fosse preciso matar a mulher, porque ela iria gerar uma criança que
se tornaria um terrível criminoso. Não sei se conseguimos.
Todos os sonhos foram tão reais quanto o
sonho da vida real.