Capítulo 30.1 – Livro de Judite
O Livro de Judite é uma fábula que conta a vitória dos hebreus sobre o poderio imensamente maior de um rei assírio. Os personagens provavelmente não existiram na forma como aparecem neste conto, mas funcionam como símbolos. Os nomes, os lugares, nada bate com fatos históricos. O Livro de Judite é, pois, uma ficção disfarçada de verdade, com a intenção de vangloriar o povo israelita e o deus daquele povo. Nem por isso deixa de ser uma história muito boa de acompanhar.
Resumo resumido: Israel é atacado pelo exército do general Holofernes, Judite seduz e degola o general, e os judeus vencem a batalha.
Telas famosas resultaram desse conto: o tema da decapitação de Holofernes seduziu muitos artistas, entre os quais, Michelangelo da Caravaggio, Artemisia Gentileschi e Goya. As telas de Caravaggio (1599) e de Gentileschi (1620) são as mais impressionantes.
O livrinho de 18 páginas, em letra miúda, pode ser dividido em cinco partes: a) as guerras de Nabucodonosor, b) o cerco à cidade de Betúlia, c) a intervenção de Judite, d) Judite e Holofernes, e) a vitória dos israelitas.
No conto, o rei Nabucodonosor inicia uma guerra contra o rei Arfaxad e o derrota. Depois da vitória, Nabucodonosor decide formar um grande exército de cento e vinte mil homens e enviá-lo para derrotar ou subjugar os povos que não haviam se aliado a ele contra Arfaxad. O comando do exército é entregue ao general Holofernes. O exército então descreve uma trajetória de vitórias e massacres e pilhagens. A seguir, Holofernes se aproxima das fronteiras de Israel, próximo da cidade fictícia de Betúlia, e oferece a paz aos israelitas em troca de aceitarem Nabucodonosor como rei e deus. Os israelitas decidem enfrentar o grande exército inimigo.
Para invadir o país pela região de Betúlia é necessário passar em um estreito entre montanhas, e os israelitas contam com essa dificuldade para derrotar o exército de Holofernes. Este decide não travar uma batalha direta e sim sitiar a cidade e cortar o acesso às fontes de água. Depois de mais de um mês de cerco, o povo da cidade está fraco e morrendo. A população pede ao juiz e aos anciãos que aceitem a rendição, e estes pedem mais cinco dias de prazo: se Deus não interceder por Israel, eles se renderão.
Judite, uma jovem viúva bela e rica, vê nessa proposta do conselho de anciãos um desafio a Deus. Ela vai até o conselho e diz que não se deve impor prazos e condições a Deus, deve-se, sim, orar e confiar nele. Por outro lado, ela tem um plano e decide agir. Ela se propõe a descer até o acampamento de Holofernes e tentar resolver a situação. Judite então se prepara, intensificando sua beleza, com joias e ricas vestes, e com uma serva desce ao acampamento. Ela diz aos soldados que quer falar com o general para indicar a melhor forma de invadir a cidade, sem a perda de qualquer soldado. Holofernes aceita recebê-la em sua tenda e gosta da proposta dela.
Judite permanece alguns dias no acampamento até que Holofernes a convida para um banquete. Ele está seduzido pela beleza da moça e diz a seus oficiais que não deixará de se unir a uma mulher tão bela. Judite participa do banquete e Holofernes, animado, fica a sós com a moça no final da festa. Todavia, ele bebeu em demasia e termina por adormecer. Judite segura a cabeça do general pelos cabelos e, com dois golpes de um alfange, degola-o. Ela coloca a cabeça do general na bolsa de sua serva e sai da tenda: diz aos guardas que vai até a fonte de água fazer suas orações.
Judite volta para Betúlia e mostra aos anciãos e ao povo a cabeça de Holofernes. A população se sente encorajada e prepara um ataque imediato ao acampamento. Quando os guardas anunciam o ataque dos israelitas e entram na tenda para acordar o general, encontram apenas o corpo decapitado de Holofernes. Isto desestrutura os oficiais e o exército, e eles são derrotados e fogem. O povo faz a pilhagem no acampamento e Judite recebe todas as riquezas da tenda de Holofernes. Em Betúlia, em Jerusalém e por todo o país há festas e danças.
Judite vive até os cento e cinco anos e nunca foi tocada por homem a não ser seu marido Manassés, quando era vivo. Antes de morrer, ela distribui suas riquezas entre os parentes. Ao morrer, é enterrada junto ao túmulo do marido.
Alguns aspectos curiosos:
Toda a parte que conta das guerras de Nabucodonosor, a formação do exército, a campanha guiada por Holofernes e o cerco aos israelitas é de muito interesse, parece um livro ou filme épico, Senhor dos Anéis.
O único lugar do Antigo Testamento em que aparece a menção ao mar Vermelho como sendo o mar que os hebreus cruzaram na fuga do Egito é aqui no Livro de Judite. Nas outras menções, incorretamente traduzidas para “mar Vermelho”, o que está escrito em hebraico é “yam sûf”, ou seja, mar de Suf, e também aparece mar dos Juncos, ou simplesmente o mar.
Judite preparou-se da seguinte forma para descer até Holofernes: lavou-se, ungiu-se com perfume, penteou os cabelos e mais, turbante, roupa de festa, sandálias, colares, braceletes, anéis, brincos, todas as suas joias. Todas as noites em que permaneceu no acampamento, ela ia até a fonte e se banhava.
Enfim, este é um conto delicioso que merece ser lido por suas qualidades literárias.